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Ecletismo no livro Psicologia Social: O homem em Movimento

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(@gustavogneves)
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Entrou: 2 meses atrás
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Estou lendo o livro "Psicologia Social: O Homem em Movimento", organizado por Silvia Lane, e algumas coisas me geram um certo desconforto:

Nos capítulos que introduzem as categorias, é comum citarem autores que não têm tanta conexão teórica entre si. Como por exemplo Vigotski e Moscovici.

Isso me dá uma dificuldade em ver essa proposta como uma abordagem estruturada. Como o ecletismo teórico é abordado nesse caso?


   
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(@gabriel-cantuaria)
Membro Admin
Entrou: 2 meses atrás
Posts: 3
 

Essa é uma ótima pergunta pensando em termos de psicologia marxista.

Eu acho que temos que definir o que é ecletismo. Citar autores de diferentes teorias não é ecletismo. Trabalhar com autores de diferentes perspectivas sem encontrar uma síntese, sem fazer a suprassunção, é. E isso é um erro comum em psicologia marxista. As pessoas querem conciliar qualquer teoria psicológica com o marxismo.

Vou dar dois exemplos: Vigotski e Skinner. Esses dois autores da psicologia geral tinham uma envergadura invejável. Eles conseguiam analisar uma série de diferentes perspectivas hegemônicas na psicologia de suas épocas. Basta lembrar que Vigotski, no texto sobre a crise, cita praticamente todas as teorias hegemônicas em psicologia da época. Em Pensamento e Linguagem, ele também cita e discute as principais teorias sobre pensamento e fala. Skinner discutiu, por décadas, com psicanalistas, humanistas, cognitivistas. Mas por que eles não são considerados autores ecléticos? Vigotski e Skinner tinham um norte. Um "caminho" a ser percorrido. A gente consegue encontrar teses centrais nos dois autores desde muito cedo. Essas teses ganham roupagens conceituais diferentes ao longo das obras, mas possuem o mesmo norte.

Agora, sobre o livro e o que se chama de Psicologia Sócio-histórica ou Psicologia Social da Escola de São Paulo. Nos primeiros trabalhos, eu vejo que eles tinham mais referências. Nota-se que eles queriam se distanciar imediatamente da psicologia social hegemônica na época (norte-americana, experimental, quantitativa). Isso faz com que eles prefiram autores contra-hegemônicos e que estavam chegando no Brasil, como Leontiev e Vigotski. Moscovici já era um clássico em psicologia social, mas a abordagem dele é radicalmente diferente do que psicólogos sociais experimentais brasileiros faziam. Por isso, eu acho que eles se viram na função de citar essas duas perspectivas. Claro que Vigotski e Leontiev eram psicólogos experimentais, mas essa parte eles ignoram. Mais sobre isso adiante.

Em trabalhamos posteriores, nós vemos que o pessoal da PUC vai se apropriando cada vez mais do marxismo. Só que eles vão fazendo alguns ajustes e correções aos soviéticos. O exemplo mais clássico é a troca do conceito de "personalidade" pelo conceito de "identidade". Outra troca é abandonar o método experimental e partir para o que eles chamam de "pesquisa qualitativa". Eu considero todas essas posições grandes bobagens, erros e retrocessos. Mas, mesmo assim, eles conseguiram produzir muita coisa original e politicamente consciente e ativa.

Agora, chega um momento que eles vão se abrindo tanto a outras referências que há um revisionismo. A tese do Bruno Peixoto de Carvalho prova isso. O marxismo é colocado de escanteio (tanto em psicologia quanto em teoria social).

O que eu acho do que temos hoje? Bom, o maior problema é que esse movimento não constrói uma psicologia geral. Portanto, não está dentro do rol de tentativas de solução da crise da psicologia. É um movimento bem isolacionista. Ele também joga fora a água do banho junto do bebê em várias posições. Foram muito inovadores e originais, talvez os mais originais que já tivemos em solo brasileiro. Mas acho que hoje a gente tem que selecionar bem o que a gente lê deles, fazer a devida crítica e superação. Felizmente, a psicologia social soviética está chegando ao Brasil e posso adiantar que ela é muito mais concisa que a Psicologia Sócio-histórica.


   
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(@gustavogneves)
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Entrou: 2 meses atrás
Posts: 5
Topic starter  

@gabriel-cantuaria obrigado pela resposta! Considerando tudo isso, você acha que existe a mínima possibilidade de construção de uma psicologia geral a partir da sócio-histórica? 

Essa pergunta vem do seguinte contexto: sou extremamente novato nesse campo, mas tenho a impressão de que alguns psicólogos da PHC lidam com a sócio-histórica com bastante receio e rejeição, deixando ela de lado na busca por uma psicologia geral. Esse é o melhor caminho? Será que partir da sócio-histórica, olhando para suas questões e problemas teóricos (e aí trazer também contribuições da soviética) poderia ser viável?


   
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(@gabriel-cantuaria)
Membro Admin
Entrou: 2 meses atrás
Posts: 3
 

Postado por: @gustavogneves

@gabriel-cantuaria obrigado pela resposta! Considerando tudo isso, você acha que existe a mínima possibilidade de construção de uma psicologia geral a partir da sócio-histórica? 

Essa pergunta vem do seguinte contexto: sou extremamente novato nesse campo, mas tenho a impressão de que alguns psicólogos da PHC lidam com a sócio-histórica com bastante receio e rejeição, deixando ela de lado na busca por uma psicologia geral. Esse é o melhor caminho? Será que partir da sócio-histórica, olhando para suas questões e problemas teóricos (e aí trazer também contribuições da soviética) poderia ser viável?

Olha, eu acho difícil. A impressão que eu tenho é que as propostas em psicologia geral, historicamente, têm surgido a partir de problemas da psicologia do desenvolvimento e aprendizagem. Essas questões (como a cognição funciona, como aprendemos novos comportamentos, quais são as fases do desenvolvimento) que parecem dar gás ao surgimento de uma psicologia geral. 

A sócio-histórica partiu de alguma concepção de psicologia geral mínima (teoria da atividade, psicologia histórico-cultural) e fez algumas modificações para "encaixar" no problema da psicologia social. Nesse caso, teríamos que fazer o caminho inverso: passar da psicologia social para a psicologia geral. Para não abandonar tudo que a sócio-histórica desenvolveu, eu acho que é possível, sim, incorporar algumas coisas. Geralmente, psicologia geral pouco fala sobre questões macrossociais. Também pode não falar suficientemente sobre comportamento grupal. Mas os seres humanos se desenvolvem em grupos, no coletivo. A individualidade é posterior à sociabilidade. Se pensarmos assim, talvez possamos fazer uma aproximação frutífera. O que acha?

Por último, eu acho que, sim, tem gente da PHC que não liga muito pra sócio-histórica. Acho que não deveria ser assim, de verdade. 

 


   
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